sábado, 30 de junho de 2012

Trecho da peça "Seis Personagens à procura de um autor", de Pirandello


Seis Personagens à Procura de Um Autor , 1951
Acervo Idart/Centro Cultural São Paulo
Registro fotográfico Fredi Kleemann

Teatro Brasileiro de Comédia - TBC, São Paulo SP

Da esquerda para a direita: Paulo Autran (O Diretor); Cacilda Becker (A Enteada) e Sergio Cardoso (O Pai)

 

O Assistente sai para dar a ordem. Pouco depois o palco se iluminará, em todo o lado direito, onde estão os Atores, com uma viva luz branca. Entre-tanto, o Ponto entrou na sua abertura, acendeu a lampadazinha e abriu o texto diante de si.

 

O DIRETOR (batendo palmas) Vamos, vamos, comecemos. (Ao Assistente) Falta alguém? ...

O ASSISTENTE Falta a Primeira Atriz.

O DIRETOR Como sempre! (Olha o relógio.) Já estamos atrasados dez minutos! Faça o favor de pô-la na tabela, assim aprenderá a ser pontual nos ensaios.

 

Mal acaba de falar, e, da porta do fundo da plateia, se ouve a voz da Pri-meira Atriz.

 

PRIMEIRA ATRIZ Não, não, por favor! Estou aqui, estou aqui! (Vem toda vestida com um chapelâo petulante na cabeça e um cãozinho no braço. Desce correndo pelo corredor e sobe apressadíssima por uma das escadinhas.)

O DIRETOR A senhora jurou fazer-me esperar sempre!...

PRIMEIRA ATRIZ Desculpe-me, procurei tanto um automóvel para chegar a tempo! Mas vejo que ainda não começaram, e eu não entro logo em cena. (Depois, chamando o Assistente pelo nome, entrega-lhe o cãozinho.) Por favor, feche-o no meu camarim.

O DIRETOR (resmungando) Ainda por cima o cãozinho! Como se fôssemos poucos, os quadrúpedes, aqui. (Bate de novo as mãos e dirige-se ao Ponto.) Vamos, vamos, o segun-do ato de A Cada Qual o Seu Papel. (Sentando-se na poltrona) Atenção, senhores. Quem está em cena?...

 

Os Atores e Atrizes saem da baixa do palco e vão sentar-se a um lado, exceto os três que iniciam o ensaio e a Primeira A triz, a qual, sem prestar atenção à pergunta do Diretor, foi sentar-se diante de uma das mesinhas.

 

O DIRETOR (à Primeira Atriz) A senhora então está em cena?

PRIMEIRA ATRIZ Eu? Não, senhor.

O DIRETOR (aborrecido) Então saia dai, pelo amor de Deus!

 

A Primeira Atriz levanta-se e vai sentar junto aos outros Atores que já se afastaram.

 

O DIRETOR (ao Ponto) Comece, comece.

O PONTO (Lendo o texto) "Em casa de Leone Gala. Uma estranha sala de jantar e de estudo."

O DIRETOR (ao Assistente) Poremos o gabinete vermelho.

O ASSISTENTE (anotando numa folha de papel) O vermelho. Perfeita-mente.

O PONTO (continuando a ler) "Mesa posta e escrivaninha com livros e papéis. Estantes de livros e cristaleira com ricos objetos de mesa. Porta ao fundo abrindo para o quarto de dormir de Leone. Porta lateral, à esquerda, pela qual se vai à cozinha. Entrada à direita."

O DIRETOR (levantando-se e indicando) Bem! Prestem atenção: lá é a entrada, aqui, a cozinha. (Indo ao Ator que fará o pa-pel de Sócrates) O senhor entrará e sairá por esta porta. (Ao Assistente) Ponha, ao fundo, uma porta de um só batente e pendure as cortinas. (Senta.)

O ASSISTENTE (anotando) Perfeitamente.

O PONTO "Cena primeira. Leone Gala, Guido Venanzi, Filipe, cha-mado Sócrates." (Ao Diretor) Devo ler também a rubrica? ...

O DIRETOR Claro! Claro! Já lhe disse mais de cem vezes!

O PONTO "Ao levantar o pano, Leone Gala, com gorro de cozinheiro e avental, bate, com uma colher de pau, um ovo, numa tigela. Filipe bate outro, também com vestido de cozinheiro. Guido Venanzi escuta, sentado."

PRIMEIRO ATOR (ao Diretor) Com licença: tenho mesmo de pôr um gorro de cozinheiro na cabeça?.. .

O DIRETOR (chocado com a pergunta) Parece-me que sim! Está escrito ali! (Indica o texto.)

PRIMEIRO ATOR Desculpe, mas é ridículo!...

O DIRETOR (saltando, furioso) "Ridículo! Ridículo!" E que quer o senhor que eu faça, se não nos vem mais, da França, uma boa comédia e se estamos reduzidos a pôr em cena peças de Pirandello, que só os "iniciados" entendem, feitas, de propósito, de tal modo que não satisfazem nem aos atores nem aos críticos nem ao público?... (Os Atores riem. Então o Diretor, levantando-se, vem para junto do Primeiro Ator e grita.) O gorro de cozinheiro, sim, senhor! E bata os ovos! E pensa que, batendo ovos, não tem nada que fazer? Pois sim, vá esperando. Tem que representar a casca dos ovos que bate! (Os Atores tornam a rir e começam a fazer comentários entre si, ironicamente.) Silêncio! E prestem atenção quando explico! (Soltando-se, de novo, para o Primeiro Ator) Sim, senhor, a casca; ou, em outras palavras: a forma vazia da razão, sem o recheio do instinto, que é cego. O senhor é a razão e sua mulher, o instinto, num jogo de papéis preestabelecido, no qual o senhor, que representa o seu papel, é, voluntariamente, o fantoche de si mesmo. Compreendeu?...

PRIMEIRO ATOR (abrindo os braços) Não!

O DIRETOR (voltando para o seu lugar) Nem eu tampouco! Vamos adiante, que no fim tudo dará certo! (Confidencial) Não se esqueça de ficar sempre de três quartos, porque, se além do diálogo já ser confuso, o senhor não se fizer ouvir pelo público, então irá tudo por água abaixo! (Batendo de novo as mãos) Atenção! Atenção! Recomecemos!...

 

(Luigi Pirandello)

 

 

MEU PRIMEIRO PIRANDELLO


(Luigi Pirandello)

            Coincidentemente, ontem, graças a um “lembrete” em um e-mail que me foi enviado pela minha querida poeta Eliana Mora, fui informado que, há 145 anos, nascia Luigi Pirandello.

            (Logo, voltei ao meu pai)

            A figura do Pirandello e a paterna, em mim, se confundem.
            Ao contrário do Pirandello, meu pai tinha apenas o curso primário e, ao se casar com a minha mãe, foi incentivado por ela a crescer – e formou-se em contabilidade. Era um homem de lagrima fácil. Sensível em último grau, sequer parecia um Contador. Do quarto, na sala o espiava, concentrado, a preparar escritas para os clientes que o procuravam lá em casa.
            É claro que – como todo pai –, ele se orgulhava da minha capacidade de imitar a dramaturgia radiofônica da época. Todas as tardes, ao seu lado – e ao lado de um rádio de válvulas  enorme –, viajávamos nas aventuras de "Jerônimo, o herói do sertão".
            (Eu era craque em imitar o Moleque Saci)
            Até que um dia, quando mais taludinho, ao perceber do meu gosto pela leitura – e, logo, por livros –, ele me trouxe o primeiro volume de uma coleção da Abril Cultural, de nome Teatro Vivo. Confesso que não gostei. Também, era o “Édipo Rei”. No entanto, a partir do segundo volume, passei a exigir-lhe  que me trouxesse mais um, mais um... e mais um!...
            Vocês – por acaso – imaginam qual foi a peça que havia naquele segundo volume? - Era um Pirandello: “Seis personagens à procura de um autor”.
            Quando releio os "Seis personagens", ainda sinto que ela é uma aula de construção dramática, e que seus personagens ainda estão vivos nos teatros do século XXI.

            Obrigado Luigi Pirandello. Obrigado meu pai.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

TÔ VOLTANDO!...




           Timidamente, “O Cesto” está, de novo, oficialmente no ar.

         Agradeço a todos aqueles que, silenciosamente ou não, me visitaram enquanto eu estava ausente. 

          Não pretendo justificar em público o meu sumiço...– mas vocês o entenderão, se acompanharem esse cestinho de lixo onde jogo um pouco da minha alma, e um pouco dos meus versos!...

                                      grato pela espera

                                                Djalma Filho