segunda-feira, 23 de julho de 2012

Goulart Gomes e Djalma Filho (poetrix) - visões dististas sobre o mesmo fato



(Em homenagem à simbólica pomba que pousou no ataúde de Dom Eugênio Sales)


eu gênio

(Goulart Gomes)

o espírito, santo

materializa-se

nas asas brancas da paz.



ora pro nobis

(Djalma Filho)

de ar e vinho,

a morte e a pomba

– em comunhão.



DOM EUGÊNIO DE ARAÚJO SALES





No início deste mês – dia nove, mais precisamente –, a Igreja Católica Apostólica Romana perde um dos seus baluartes: o Arcebispo Emérito do Rio de Janeiro, Cardeal Dom Eugênio de Araújo Sales.   

Em 1965, ele tornou-se administrador apostólico da Arquidiocese de Salvador e, quatro anos depois, foi nomeado pelo então papa Paulo VI, arcebispo de Salvador e primaz do Brasil. Em Salvador, Dom Eugênio criou as Comunidades Eclesiais de Base, a Campanha da Fraternidade e o Movimento de Educação de Base.

Em setembro de 1970, uma declaração do arcebispo num programa da Rádio Cultura da Bahia de nome “A Fala do Cardeal”, encheu de perplexidade muitos brasileiros – nela, ele alertava os fiéis da sua diocese contra a TFP (Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade) e se posicionava perante o problema do comunismo e do antocomunismo no meio católico.


(leiam a transcrição da declaração)


“[...] Devem estar alertas, os católicos desta Arquidiocese, com o movimento denominado Tradição, Família e Propriedade. Não conta com a aprovação e qualquer apoio da Arquidiocese. Pelo contrário. Tem a reprovação do Cardeal Arcebispo.

Meus prezados radiouvintes. Em sua audiência pública de 15 de julho último, o Papa Paulo VI, referindo-se a este período pós-conciliar, nos admoesta: “É preciso vigiar”. E ainda na mesma ocasião, nos afirma: “Esta fidelidade à Igreja, bem o sabeis, hoje é traída por muitas pessoas, discutida, interpretada subversivamente e minimizada”. O mesmo se pode dizer em relação à segunda conferência geral do Episcopado Latino-americano, realizada em Medellín. Ora esse magnífico documento “Presença da Igreja na atual transformação da América Latina” é retirado do seu contexto religioso e reduzido a meras dimensões econômicas, sociológicas ou políticas; ora determinadas expressões isoladas são apresentadas como linhas determinantes ou regras de ação, oriundas dessa notável assembléia do Episcopado Latino-Americano; ou ainda, o que é mais grave, esse documento é explicado, divulgado dentro de categorias marxistas, especialmente o que se refere à justiça e paz, com reflexos na própria catequese, que para alguns passa a ser inspirada e elaborada à luz de Marx e não de Jesus Cristo.

Meus prezados radiouvintes, vivemos num período de transição. É realmente louvável a busca de novos caminhos, que levem a massa de nosso continente, e em particular a do Brasil, à pregação evangelizadora e abram perspectivas ao conhecimento e vivência da Boa Nova. Constitui, entretanto, nefando pecado sacrificar a pureza da doutrina a pretexto, aliás falso pretexto, de facilitar a aceitação por parte de quem deve receber a mensagem. É certo, de um lado, que há uma fobia de comunismo, que não é raro constatar-se que este espantalho é utilizado para fins escusos, inclusive o de impedir as legítimas e necessárias transformações sociais, ou intitular de marxismo o que é o Evangelho autenticamente interpretado. Devemos, entretanto, reconhecer também que existe um esforço inteligente e organizado de difundir a doutrina marxista, utilizando todos os meios, inclusive ilícitos, como a interpretação errônea do documento de Medellín, acima citado.

A teologia da libertação anunciando o Cristo ressuscitado, vencedor da morte, libertando-nos da cadeia do pecado, pode ser amesquinhada e traída quando, a pretexto de salvar os homens das injustiças sociais, fica reduzida a uma mera visão marxista da vida. O mesmo se diga de um esforço de conscientização na base somente de uma visão “oprimido e opressor”. É uma traição ao Evangelho tentar divulgá-lo como uma luta de classes e do ódio entre os homens. Não devemos ter medo do comunismo se não formos ingênuos na aceitação de princípios ou métodos que jamais poderão denominar-se de evangélicos.

Meus prezados radiouvintes. O Santo Padre, na Alocução acima referida, nos adverte: “É preciso vigiar”. Nesses dias se faz necessário, de uma maneira especial, nossa adesão inabalável a uma autêntica mensagem do Evangelho de Jesus Cristo. Jamais poderemos recorrer ao marxismo para difundir Jesus Cristo. Seria uma aberração inconcebível. Necessário também se faz uma ação corajosa para impedir, custe o que custar, a deturpação de documentos do porte e valor das conclusões de Medellín, caminho aberto à redenção espiritual e social deste continente”.

               Dom Eugênio Sales
                (Arcebispo Primaz do Brasil)

 

quinta-feira, 19 de julho de 2012

segunda-feira, 16 de julho de 2012

EXCELÊNCIA AO PORCO MORTO




EXCELÊNCIA AO PORCO MORTO

(Djalma Filho)

                                         ao vê-lo assim,
                                                                  tão magro,
                 entre sacos descartáveis, latas de cervejas e garrafas de plástico,
                                        dei a querer saber qual a mais feia das carcaças:
                                                                a dos bichos ou a dos homens?  

                            ao seu lado direito, um rato de esgoto,
                                        ao seu lado esquerdo, um cachorro magro
– qual, enfim, a mais feia das carcaças?! 

                                        Ontem,
numa vala enorme próxima à minha casa,  
                                                    eu vi a caveira de um porco
                            – parecia ter sido um porco estupidamente gordo –
                                                                que,
                                                                ao invés de uma maçã na boca,
                                                                                                   trazia 
                                                    um sem número de moscas varejeiras
                                                   
                                                                [a gordura escorreu-lhe]

                                                                                       mas,
                                                                           naquela carcaça de porco
                                                    – provem-me, por favor, ao contrário – 
                                                                havia, sim, uma alma:
                                                                           alma igual a alma de gente

                                                    [a alma também escorreu-lhe?]

                                                                           e,
                                        ainda pensando na qual mais feia das carcaças,  
                                                                           segui
                                                                tal e qual o porco da vala:
                            a arrastar no corpo gordo, uma probabilidade de alma! 
                                                                                        



PROGRAMA PARA DEPOIS DE MINHA MORTE - Manuel Bandeira

PROGRAMA PARA DEPOIS DE MINHA MORTE

(Manuel Bandeira)



... esta outra vida de aquém-túmulo.
Guimarães Rosa

Depois de morto, quando eu chegar ao outro mundo,
Primeiro quererei beijar meus pais, meus irmãos, meus avós, meus tios, meus primos.
Depois irei abraçar longamente uns amigos -
Vasconcelos. Ovalle, Mário...
Gostaria ainda de me avistar com o santo Francisco de Assis.
Mas quem sou eu? Não mereço.
Isto feito, me abismarei na contemplação de Deus e de sua glória
Esquecido para sempre de todas as delícias, dores, perplexidades
Desta outra vida de aquém-túmulo.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Back In Bahia Gilberto Gil)



RELEMBRANÇA - Djalma Filho



RELEMBRANÇA

 

(Djalma Filho)


(Gilberto Gil fez setenta anos)


Certamente,
pelo menos uma das mulheres que há em mim,
já cantou da tua melodia
                                              mas,
se a ciranda de um tempo menino não mais puder rodar,
se o sol dos baianos não tiver mais onde se pôr
ou comungar canga e semente,
de grão em grão hei de encher o meu papo
                                           [furado]
            com a tua cantoria
vinda das agulhas a ararem – nos sulcos – um meio mundo de estrelas!...
Certamente,
pelo menos um dos homens que há em mim,
já sentiu da tua poesia

[teu meio poeta é a tua porta de saída]

                                            mas,
se o fel humano não mais puder moer o bagaço da cana,
se a fé verde-viva não tiver mais ganho sobrevidas
ou deuses morrerem de inanição,
de grão em grão hei de encher o meu papo
                                                        [furado]
                  com a tua rimaria
vinda da disposição das letras postas para reescreveres a velha Bahia!...

quinta-feira, 5 de julho de 2012

EXPRESSO 2222

LOUVAÇÃO





            Ainda mexendo no baú das minhas memórias – lhes prometendo que “O Cesto” terá muito mais poesia que blablablá –, lembro-me da noite em que vi um neguinho com uma camisa de gola rolê, tímido, entrando no estúdio da TV Itapoã – era assim quem se escrevia –, na Bahia, como calouro, num programa chamado “A Escada para o Sucesso”. O sambinha que ele cantou chamava-se “Mancada”. Vocês, por acaso, podem imaginar quem era aquele neguinho?... – sim, ele mesmo: Gilberto Passos Gil Moreira, que, no dia 26 de junho deste, completou setenta anos.

(Gil não se importa em ser chamado de neguinho, nem o samba, de sambinha)

            O “Escada para o sucesso” era um seleto programa de calouros que, por objetivo, descobria talentos baianos – como se fosse necessário. Se não fosse por duas menininhas chamadas Cynara e Cybele que – em duo – não só eram afinadas como encantavam, certamente o Gil o venceria. Mais tarde, Cynara e Cybele formaram o “Quarteto em Cy”.

Fiquei uma pá de tempo sem saber por onde andava aquele neguinho. Até que um dia, meu pai me chega em casa com um LP chamado “Louvação” – e adivinhem quem estava na foto da capa?... O próprio Gilberto Gil. Era o seu primeiro disco.

Realmente, o meu pai tinha um refinado gosto musical. Dele, eu herdei o “Chega de Saudade”, do João Gilberto, e o “Louco por você”, de um tal Roberto Carlos.

“Louvando o que bem merece, deixo o que é ruim de lado".

(Gilberto Gil)

                       Parabéns Gil!